Cara Delevingne e Dane DeHaan em Valerian e a Cidade dos Mil Planetas

Luc Besson parece ter realizado o seu sonho de criança ao dirigir Valerian e a Cidade dos Mil Planetas. A intenção do diretor era de claramente produzir uma ópera espacial sem precedentes, mas as decisões narrativas que ele tomou ao longo do caminho fizeram a realidade se distanciar deste desejo.

No filme, que chegou aos cinemas brasileiros em agosto deste ano (2017), acompanhamos a jornada aventureira de Valerian, vivido por Dane DeHaan, e sua companheira Laureline, interpretada por Cara Delevingne. Na trama, os personagens descobrem que um grande segredo do governo humano, que lidera uma ordem de união intergalática, pode comprometer todo este império. A dupla de protagonistas, então, acaba envolvida em todo esse acobertamento tentando corrigir os erros do passado e ajudando a evitar a extinção de uma espécie.

No começo de tudo, Valerian e a Cidade dos Mil Planetas é como se fosse uma embalagem de presente gigante, a mais linda e exuberante já vista por alguém. Toda essa beleza visual, que chega a ser espantosa por tamanha perfeição, começa a empolgar e criar boas expectativas para o que virá ao longo do o tempo restante da projeção. Luc Besson sabe explorar o visual por ele concebido, gira a câmera para mostrar a imensidão da paisagem do planeta Mühl, explorando também uma nova cultura que já avisa o quão rico e vasto universo de Valerian pode ser.

O diretor, bastante vaidoso, exibe diversas referências aos seres criados em O 5º Elemento (1997), filme que ele mesmo dirigiu no final da década de 1990. Aliás, no filme estrelado por Bruce Willis, Luc Besson consegue explorar uma narrativa bastante simples, que combina com jeito de fazer cinema da época, além de apresentar um aconchegante senso de aventura que completa a história. Em Valerian e a Cidade dos Mil Planetas há uma clara pretensão de replicar isso, e é bem verdade que na primeira hora de filme o diretor consegue realizar decentemente este feito. Ao mesmo tempo em que isso acontece, uma pulga atrás da orelha começa a incomodar, ao ver em projeção um filme visualmente tão sofisticado se desenvolver com uma história simplória, principalmente quando esta apresenta um potencial capaz de acompanhar a beleza visual do longa.

Cena de Valerian e a Cidade dos Mil Planetas

Óperas espaciais como Star Wars e Star Trek trouxeram ao longo da história não só aventura e diversão para a tela do cinema, mas também discussões e pensamentos que transcendem apenas os conceitos básicos do cinema de entretenimento. Star Wars, ao mesmo tempo que garante sempre uma boa aventura espacial, também combate governos imperialistas e regimes totalitários. Enquanto isso, Star Trek tem uma grande luta pela representatividade e igualdade entre as diferentes raças do universo. E no momento em que Valerian poderia ter levantado a sua própria bandeira, na luta contra o genocídio e mostrando que ser mais do que uma embalagem bonita, o filme de Luc Besson se contenta em solucionar seus problemas com um discurso piegas de amor universal, quando tal sentimento não consegue ser transmitido pela dupla inexpressiva de atores que protagonizam o filme – fora o fato de ser uma solução genérica e preguiçosa, que evoca um discurso que parece não fazer parte do filme.

Valerian e a Cidade dos Mil Planetas é uma mistura heterogênea de ideias interessantes mal executadas e nem sempre finalizadas. É um filme que insere elementos que mostram uma grande concepção de universo, que apresentam criaturas exuberantes, povos, culturas e suas particularidades, ao mesmo tempo em que tudo isso é apenas jogado em tela para o espectador perceber o quão interessante tudo aquilo pode ser, e o quão inexplorado é esse universo. A ópera espacial construída aqui, não só demonstra a falta de um objetivo como apresenta soluções rápidas e mal pensadas, além de genéricas para combinar com a simplicidade do roteiro. Assim, o diretor mostra que a inventividade estética que consegue conceber para o longa não se reflete na hora de construir o roteiro.

Em suma, para um filme visualmente tão sofisticado, com efeitos visuais tão primorosos e soluções estéticas igualmente poderosas, Valerian e a Cidade dos Mil Planetas não foi ousado o suficiente quando se tratou da sua história. A narrativa perde o foco por boa parte da projeção ao levar os protagonistas em uma pequena aventura particular que não agregava em nada para a trama, quando o próprio roteiro poderia inserir Valerian e Laureline em plots aventurescos que ajudassem a encaminhar história do filme. Enquanto isso, o longa apresenta rápidas cenas do General Okto Bar (Sam Spruell) para mostrar que a trama principal do longa ainda existe – e segue quase sem importância.

Cena de Valerian e a Cidade dos Mil Planetas

Para Luc Besson, que acertou em cheio em O Profissional (filme de 1994 estrelado por Jean Reno e Natalie Portman), conseguiu fazer um trabalho muito bem concebido no já citado O 5º Elemento e passou perto do acerto com Lucy, Valerian e a Cidade dos Mil Planetas simboliza um desperdício de talento do diretor – além de uma das grandes decepções cinematográficas de 2017. Luc Besson é habilidoso e sabe explorar muito bem os cenários que cria, tem conceitos visuais que são muito bem aplicados, mas a deficiência narrativa do filme, que opta por livre e espontânea vontade em ser simplório apenas para atingir um grande público, acaba prejudicando tudo o que poderia ter funcionado no longa.

É evidente, ainda, que tudo o que Valerian e a Cidade dos Mil Planetas precisava para surpreender e apresentar um filme de estética e história incríveis estava nas mãos do diretor e também roteirista, mas o mesmo fez escolhas que não levaram o filme para o melhor caminho. Valerian e a Cidade dos Mil Planetas tem capacidade de entretenimento, e serve como uma boa distração, no entanto, o filme acaba sendo uma quase ópera espacial, uma quase grande aventura e uma quase grande história. Como resultado de todas as más decisões, o longa amargurou uma baixa bilheteria (US$ 225,8 milhões no mundo todo para um orçamento de US$ 177 milhões, sem contar os custos de marketing) e uma recepção ruim da crítica especializada internacional (e reações mornas da crítica brasileira) – sendo tudo isso o necessário para que uma produção seja considerada como um fracasso, e neste caso, uma grande decepção.