Maus, suspense do novato Yayo Herrero pode desagradar com sua trama simples e desconexa, mas sua história guarda detalhes interessantes sobre a Guerra da Bósnia e a atual situação dos países europeus em relação à imigração massiva que acontece desde 2013, além do terrorismo que amedronta as superpotências ocidentais.

Em Maus, vemos a história de Alex e Selma, um casal apaixonado que viaja ao coração da Bósnia e Herzegovina, quando, de repente, ela sente que alguém está perseguindo-os. Selma se apega a um amuleto muçulmano, hamajlija, em busca de proteção. Mas, deixando o sobrenatural de lado e focando nos quatro personagens principais – Selma (Alma Terzic), Alex (August Wittgenstein), Vuk (Aleksandar Seksan) e Milos (Sanin Milavic) – percebe-se que cada um deles possui uma nacionalidade diferente. Selma é uma bósnia bosniak, ou seja, muçulmana; Alex é alemão; Vuk e Milos são sérvios.

Durante o filme, vemos como a personagem de Alma Terzic é traumatizada e assombrada na infância, época em que foi feita prisioneira durante a Guerra da Bósnia, quando seus pais e irmão foram mortos por soldados sérvios por serem muçulmanos. Alex é apresentado como um namorado europeu amigável, sempre querendo manter o controle de situações problemáticas, confortando Selma e falando incessantemente que tudo ficará bem, mesmo sendo evidente a catástrofe diante de seus olhos. Vuk e Milos são os vilões, que se mostram amigáveis no começo, mas, quando tem a oportunidade, se aproveitam da situação vulnerável do casal.

Todos estes personagens caricatos representam exatamente os países, na vida real, do qual são naturais. Selma é a devastada Bósnia e sua população traumatizada por uma guerra onde praticamente todos os muçulmanos foram mortos. Alex é a poderosa Alemanha, mas também pode ser visto como todo o continente europeu, sendo até apelidado de “Europa” no decorrer do filme. Enquanto Vuk e Milos acabam representando os intolerantes.

A história mostrada no filme condiz, e muito, com a atual situação que se encontra o Ocidente e Oriente Médio, que enfrentam uma crise emigratória decorrentes das guerras que assolam os países do Oriente Médio, principalmente os de etnia muçulmana. Guerras, essas, que revelam como consequências das decisões de países ocidentais, que visam interesses próprios em detrimento da vida de milhares e a pobreza de muitos.

A Europa é o atual destino de muitos refugiados, que buscam sobreviver nas suas terras ricas e prósperas, lar de muitas economias sólidas e dos maiores IDH’s (Índice de Desenvolvimento Humano) do mundo. Por sua vez, o continente europeu se mostra cada vez mais intolerante a esta imigração em massa, recusando refugiados e os deixando sem abrigo e proteção.

Maus retrata essa crise que o mundo está vivendo. Selma, vítima da intolerância, questiona no ato final onde Alex estava enquanto ela corria por dentro de uma mina escura, lutando e rezando por sua sobrevivência, sendo obrigada a matar. Alex, o namorado que jurou protegê-la, demonstra nada além de um silêncio omisso e cheio de repulsas em seu olhar pela decisão que Selma tomou, frente a Vuk e Milos. Alex, torna-se o principal culpado por tudo que aconteceu ao não dar ouvidos às opiniões de Selma, que sempre pediu para que ele a escutasse.

A cena final do filme é uma consequência de todas as decisões tomadas pela sociedade ocidental em relação aos países do Oriente Médio, e toda a omissão dos governos ocidentais com os imigrantes: Um atentado terrorista, que poderia tanto ser de autoria de Selma, como de qualquer outra pessoa que passou pela omissão e o descaso ocidental.

No filme, ainda, Selma está novamente na Bósnia, onde os corpos de seus familiares, desaparecidos durante a Guerra, surgem na beira de um rio após uma enchente severa na região. Isso aconteceu de fato na vida real, dois corpos surgiram após o rio Bosna transbordar, corroborando o genocídio da população muçulmana do país durante a Guerra.

O vilarejo onde Selma vivia também remete à triste realidade da guerra, localizado nas proximidades de Srebrenica, onde ocorreu um massacre de todos os moradores homens, que foram levados a um estádio de futebol, onde foram mortos, e posteriomente enterrados na vegetação ao redor do local. E, diante de todo esse genocídio ocorrendo na década de 90 na Europa, as nações europeias, assim como a própria ONU, ignoraram o que estava ocorrendo, até que vídeos e fotos foram divulgadas pela imprensa, ganhando visibilidade.