Divulgação/Netflix

Julgando pelo material de divulgação (prévias em vídeo, imagens e artes promocionais), a expectativa criada por Maniac é de que a Netflix mais uma vez investiria em um produto complexo, misturando ficção científica com humor negro e uma pitada de drama tragicômico, ao melhor estilo Fargo.

De fato, os dois primeiros episódios da minissérie cumprem a expectativa. No começo, Maniac se mostra uma série complexa, com uma modesta influência de Blade Runner – um mundo depressivo, que mistura tecnologia com a decadência ética e social de uma sociedade, fora o visual retrógrado. Assim, deixando o espectador a par do que acontece, o mesmo público, se interessado, se pega procurando entender o que essa série está querendo lhe dizer.

Então é aí, nesse pequeno questionamento, que Maniac trata de, aos poucos, mudar toda essa primeira impressão interessante que causou. Contudo, a mudança acaba sendo bem-vinda, mérito da série que faz o espectador entender as suas escolhas.

Acompanhando a vida perturbada do esquizofrênico Owen (Jonah Hill) e da frustada Annie (Emma Stone), Maniac constrói o que futuramente será o seu propósito principal. Se inicialmente a série deixa entender que embarcaremos em uma jornada sem precedentes para entender mistérios da mente humana, o roteiro trata, logo, de deixar bem claro que tudo será muito mais simples do que isso.

Maniac
Divulgação/Netflix

Para entender isso, Maniac aprofunda sua narrativa dentro dos anseios e desejos das vidas de Owen e Annie, contrastando o principal problema da vida de ambos com aquilo que, talvez, eles realmente quisessem para si – assim como, também, o medo de que dar certo também poderia dar errado.

Maniac trata-se do fator humano, que faz da criação, o ser, tão imperfeito. O ensaio, ou teste, do qual os personagens são cobaias, é uma forma de terapia química que ajudará cada um a resolver os seus próprios problemas, passando por fases (pílulas) que incentivam a psique de cada um a revisitar lugares que eles têm medo de ver. Mas, a última e mais importante fase desse processo, a confrontação, mostra que para superar tudo isso é preciso, de fato, confrontar o obstáculo.

Ao aprofundar esses temas, Maniac transforma sua aparente subjetividade em humanidade, compaixão, amizade e, porque não, beleza. É notável o processo de mudança que a série se propõe a passar, saindo de um clima denso e depressivo para um tom mais ameno e cheio de possibilidades. Tudo isso após desafiar seus próprios personagens a enfrentar essa mesma mudança em uma viajem fantasiosa, repleta de alegorias que a todo momento diziam que esses personagens precisavam enfrentar seus problemas, e claro, superá-los.

Maniac tem qualidade técnica acima da média, pode não ser algo nítido o que a faz ser diferente das demais, mas suas próprias nuances são suficientes para identificar o carácter que a faz ser diferente. Bem dirigida e escrita, com uma fotografia que ressalta ainda mais a ambientação ambígua e cheia de contrastes de um mundo retrô tecnológico, Maniac se sai bem dentro das suas intenções, sendo intrigante no começo e encantando com o seu desdobramento final – deixando uma mensagem positiva sobre a vida como uma espécie de lição, ou legado.

Maniac
Divulgação/Netflix

Despretensiosa, a minissérie da Netflix encontra equilíbrio na dupla de protagonistas. Emma Stone atua com tranquilidade, dentro daquilo que há alguns anos a fez despontar até o Oscar de Melhor Atriz que ganhou por La La Land – Cantando Estações. O feito de Jonah Hill é um pouco mais notável por estar fora do que costuma apresentar, se transformando em um esquizofrênico traumatizado e demonstrando com empenho o peso que esse personagem carrega. Justin Theroux e Sonoya Mizuno, ainda seguem a boa linha dos protagonistas, tendo aqui dois personagens caricatos que também tinham suas pendências para resolver – uma jornada menor, mas igualmente satisfatório dentro do que Maniac quis propor ao público.

Maniac muda da água para vinho, e essa transformação torna-a cada vez mais saborosa com o passar dos seus 10 episódios, sendo o seu último gole a melhor parte dessa mistura de gêneros e boas intenções. A Netflix, mais uma vez, acerta em apostar em um produto bem produzido que diz mais do que aparenta e que se contenta com a dignidade de não precisar de grandiloquências para se sobressair.

Avaliação
Avaliação: Muito bom
8.0
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Sou jornalista, fundador e editor da Matinê Cine&TV. Escrevo sobre cinema e séries desde 2014. No jornalismo tenho apreço pelo cultural e literário, além de estudar e trabalhar com podcasts. Além dos filmes e séries, também gosto de sociedade e direitos humanos.