Game of Thrones - 8ª temporada
Game of Thrones - 8ª temporada / Imagem: IMDb

Existe uma diferença notável entre o que era e o que se tornou Game of Thrones na TV. Na temporada inicial, a série adapta o primeiro volume das Crônicas de Gelo e Fogo de forma exemplar, dando vida a história criada por George R. R. Martin, com momentos e diálogos perfeitamente reproduzidos no audiovisual.

Com o passar das temporadas começou um distanciamento entre a obra original e a adaptação. As diferenças surgem a partir do final do terceiro ano do programa, pois o Casamento Vermelho foi o ponta pé inicial para que a HBO e os produtores entendessem o grande valor de entretenimento que tinham em mãos. A partir disso, a série recebeu um investimento muito maior e sua fantasia tímida passou a ter uma relevância maior dentro do espetáculo.

Até a sexta temporada (a última com 10 episódios no total), Game of Thrones ainda conseguia manter coerência narrativa e bom desenvolvimento da história e dos personagens. As duas últimas temporadas, ao contrário disso, têm outras intenções, e a consequência é um final derradeiro para o grande fenômeno cultural da TV mundial na década de 2010 – afinal, o sucesso em números e prêmios é inquestionável.

Game of Thrones - 8ª temporada
Game of Thrones – 8ª temporada / Imagem: IMDb

Reduzir o número de episódios, a partir da sétima temporada, sempre foi um tiro no pé para Game of Thrones, que tinha no tempo de desenvolvimento o cerne do seu sucesso. Com menos tempo, tudo passou a ser mais “objetivo” e por consequência corrido. Sem o mesmo cuidado na narrativa, a pressa de entregar um gran finale ficou evidente e os fatos, em sua maioria, parecem ter sido apenas jogados na tela.

Nessa mudança de prioridade, Game of Thrones abriu mão do roteiro bem desenvolvido em detrimento do espetáculo visual. Apesar disso, há também o mérito: o que a série fez visualmente, nas suas duas últimas temporadas, o cinema já não faz há algum tempo. O resultado não é uma surpresa, pois o investimento feito para a “construção” do evento final foi para alavancar o entretenimento de encher os olhos que a série se tornou.

Não há dúvidas de que Game of Thrones ficará marcada pelo final medíocre que apresentou no domingo, 19 de maio de 2019. A série não só ignorou parte do que construiu em seis temporadas, mas também mudou, bruscamente, os rumos da sua história com a “desculpa” de surpreender o público.

Game of Thrones - 8ª temporada
Game of Thrones – 8ª temporada / Imagem: IMDb

Os feitos visuais do oitavo, e derradeiro, ano de Game of Thrones foram sempre engolidos com um gosto amargo – a destruição de Porto Real é um espetáculo cruel sem pé nem cabeça. Ao longo dos anos a série construiu, sim, traços da possibilidade da loucura de Daenerys (Emilia Clarke) – assim como do seu imperialismo que ascenderia ao derrubar outro -, mas justificá-lo em cenas curtas em dois episódios, por exemplo, mostra a falta de cuidado e pressa do roteiro.

Ademais, há algo importante a ser ressaltado: Emilia Clarke, indo contra ao que mostrou nas últimas temporadas, entrega algumas das suas melhores atuações em Game of Thrones. Embora o roteiro soe apressado ao apresentar os twists de sua personagem, a atriz trouxe o “crível” para esses acontecimentos. Ou seja, mesmo no erro, há ainda um acerto.

Em retomada, a série apresenta motivos suficientes que justificam isso (a brusca mudança de comportamento da personagem), mesmo tendo escolhido trabalhá-los de última hora. Os equívocos do roteiro não se resumem apenas a este caso isolado, eles espalham-se por todos os personagens que, de alguma maneira, tiveram o seu rumo prejudicado pelas escolhas ruins da última temporada.

Ter 11 semanas de filmagens envolvendo 750 pessoas, prometer momentos épicos, feitos visuais sem iguais na TV, e tudo mais, não foram o suficiente para a última temporada de Game of Thrones. Isso, inclusive, não é exigência ou obrigatoriedade da emissora ou dos roteiristas entregar algo melhor. A série, desde que Winter is Coming (1×01) construiu algo muito maior do que o desfecho do último episódio, e desenvolveu uma história muito mais bem arquitetada.

Game of Thrones - 8ª temporada
Game of Thrones – 8ª temporada / Imagem: IMDb

A oitava temporada deveria ser o apogeu de Game of Thrones, mas ficará resumida a feitos visuais incríveis e um roteiro fraco, mal desenvolvido e de rumos questionáveis. É uma discussão sem fim, mas com senso comum de que o final não chegou perto do que realmente poderia, ou deveria, ser. GoT acaba entrando em um seleto grupo de grandes séries de sucesso com final controverso, ou (simplesmente) ruim.

Embora trágico, de muitas maneiras, Game of Thrones entrega ao seu público um grande espetáculo visual (os episódios “evento” da temporada final, trazem uma fotografia refinada com enquadramentos inesquecíveis, e retratam ainda alguns dos elementos que constroem a identidade marcante da fantasia realista de Game of Thrones). Momentos épicos, claro, não faltaram, mesmo recheados de amargura das escolhas criativas desagradáveis que ocorreram.

Game of Thrones será lembrada por inúmeros motivos, não apenas pelo fim. Este, mesmo sem fazer jus ao todo, não apaga o que construiu o nome da adaptação que popularizou ainda mais a rica obra de George R. R. Martin. Chega ao fim o sucesso de um tempo.

Avaliação
Regular/Bom
6.5
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Sou jornalista, fundador e editor da Matinê Cine&TV. Escrevo sobre cinema e séries desde 2014. No jornalismo tenho apreço pelo cultural e literário, além de estudar e trabalhar com podcasts. Além dos filmes e séries, também gosto de sociedade e direitos humanos.