A Netflix e a Marvel demoraram um pouco para enfim chegar em Os Defensores, mas o histórico das séries lançadas como fruto dessa parceria nunca foi unânime e esperar que a série que reuniria o grupo de super-heróis urbanos de Nova York fosse, literalmente, de arrasar quarteirão seria um certo exagero. Para confirmar isso, o resultado final, explorado em oito episódios, traz uma boa aventura, mas mostra, principalmente, que há muito o que arrumar neste universo urbano da Marvel na Netflix.
Os episódio iniciais de Os Defensores, pelo menos os quatro primeiros, são de longe os mais empolgantes da temporada, afinal eles envolvem um roteiro que precisa ser dinâmico e que não depende do espetáculo visual das cenas de ação (algo que pouquíssimas vezes aconteceu nas séries individuais). Sendo assim, são episódio mais ágeis, que exploram os diferentes núcleos de cada personagem, e até podem ser considerados eficientes por trabalharem bem as ações que culminariam no encontro de Demolidor (Charlie Cox), Jessica Jones (Krysten Ritter), Luke Cage (Mike Colter) e Punho de Ferro (Finn Jones).
Porém, a partir da reunião destes quatro personagens fica nítida a discrepância de qualidade de cada núcleo da série. Demolidor e Jessica Jones, além de terem os melhores intérpretes, mostram que são os personagens mais solidificados da Marvel na Netflix. Luke Cage, por outro lado, está mais leve e solto do que na sua série individual, e isso é bom. Mas, no meio destes acertos, há o câncer da série: o Imortal Punho de Ferro. Finn Jones combina visualmente com o personagem, em parte, mas os problemas de Danny Rand começam quando o personagem precisa falar alguma coisa, pois os piores e mais burros diálogos da série são pertencentes ao Punho de Ferro.
O personagem é de longe o pior entre todas as séries, e como se isso não bastasse parece totalmente desprovido de inteligência. Há uma passagem, pouco memorável, em que Danny Rand descobre o motivo do Tentáculo estar atrás dele (pois o Punho de Ferro abriria a passagem para os vilões conseguirem o que estavam procurando), algo didaticamente explicado. Logo em seguida, a cena é cortada para um diálogo entre Rand e Colleen (Jessica Henwick), dentro do carro, onde Danny se questiona sobre o que o Tentáculo quer com ele, e a falha de ver uma explicação tão didática ser incompreendida pelo personagem apenas prova o tamanho de sua imbecilidade.
Com a frequência de diálogos ruins por conta do Punho de Ferro, fica evidente que o grande problema de Os Defensores é o seu roteiro. Nos episódios iniciais, agora os três primeiros, é possível sentir uma grande ameaça por parte do Tentáculo, bastava, apenas, a série mostrar qual o objetivo dos vilões para que este senso de perigo fosse justificado. Entretanto, é difícil entender o que o Tentáculo realmente quer. A organização foi concebida com status de poderosa, mas se mostrou só mais um grupo de pessoas mau intencionadas e que nem sabem o querem direito (em um momento o objetivo é destruir Nova York, depois é a vida eterna ou apenas voltar para K’un-Lun, enfim).
Esse problema central, que vem desde Punho de Ferro, torna-se ainda mais fraco pelo envolvimento passional que Danny Rand apresenta com o Tentáculo por causa da morte dos seus pais. Por outro lado, poderíamos ter um lado mais lógico por conta do histórico do Demolidor com o grupo de vilões, mas tudo se resume ao mesmo senso de perigo que não se justifica na série. Apesar disso, Demolidor tem um arco melhor durante a temporada, onde o envolvimento pessoal com Elektra (Elodie Yung), mesmo que totalmente genérico, se justifica com facilidade.
A personagem, que havia morrido na season finale da segunda temporada de Demolidor, retorna muito melhor do que a sua aparição anterior, e ela ainda protagoniza uma das melhores lutas da temporada em um dos flashbacks do seu trainamento depois de voltar a vida. É claro, ainda, que apesar da ação bem conduzida nessa cena, e em algumas outras, não há nada de exuberante na coreografia da luta, mas, é claro, que está acima da péssima média da ação da série. Elektra e Demolidor, inclusive, protagonizam uma boa luta no terceiro episódio da temporada, que é o melhor entre os oito que compõe o primeiro encontro entre os personagens.
Os Defensores tem muito o que ensinar para a casa das ideias da Marvel na Netflix. A primeira temporada, em suma, garante uma boa diversão para quem fecha os olhos e ignora determinados problemas. Mas para quem está realmente de olho em tudo, todas as fragilidades do programa ficam bastante óbvias, desde o seu roteiro fraco nos momentos mais decisivos, até a coreografia precária das cenas de ação no que deveria ser o climax da série.
É claro que nem tudo é ruim em Os Defensores, enquanto existem problemas narrativos e estruturais no desenvolvimento de todo o plot que não sabe o que quer, o carisma dos personagens é capaz de tirar a atenção desses problemas. A Netflix já havia estabelecido um universo de heróis urbanos com os pés no chão, encarando suas histórias individuais com a seriedade que elas precisavam ter. Já em Os Defensores, apesar de, teoricamente, a trama ser bastante séria, o clima entre os heróis é muito mais descontraído em alguns momentos, onde, inclusive, tentam replicar o tom cômico dos filmes da Marvel, e conseguem, desde as piadas bem feitas até aquelas desnecessárias.
Para uma primeira temporada, Os Defensores não fizeram feio, mas o que foram capazes de fazer também não foi o suficiente para dizer que foi algo bonito. As expectativas, depois do fracasso de crítica de Punho de Ferro, eram boas, porém receosas, e por conta disso podemos afirmar que Os Defensores não decepcionaram, mas também não surpreenderam. Apesar de apresentar essa boa primeira temporada, a nova série da Netflix serve, muito bem, para os produtores e roteiristas enxergarem os problemas do produto final, e que, não por acaso, são os mesmo das séries individuais de cada personagem.
Avaliação
[yasr_overall_rating size=”medium”] (Bom)