
Sucesso de bilheteria e de crítica na França, 120 Batimentos Por Minuto é o representante do país na corrida pelo Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, na verdade, era. O longa acabou por não ser selecionado na lista dos últimos dez longas que concorrem a uma vaga na premiação, mas isso não é demérito algum para o Robin Campillo traz ao cinema – o campeão do prêmio do júri em Cannes no ano passado.
120 Batimentos Por Minuto traz um retrato íntimo e intimista do grupo ativista Act Up de Paris, que luta por um melhor plano de prevenção e combate a AIDS no país. Os primeiros minutos do filme mostram muito da sua proposta: um diálogo aberto sobre a AIDS, que visa apresentar a causa da Act Up e também traduzi-la para um público maior, mesmo que o filme, comercialmente, não tenha em mente a massa como sua meta. A primeira hora do longa é completamente dedicada as diferentes vertentes e desafios de quem abraça a causa, deixando claro que até mesmo os soronegativos são considerados soropositivo perante a sociedade no momento em resolvem se juntar a alguma dessas militâncias.
O filme, além de trazer um retrato realista da luta, ainda é incisivo ao mostrar a incapacidade do governo francês e das agências farmacêuticas de criarem um plano de prevenção, e também de conscientização, contra a AIDS, além da falta de avanço em relação aos estudos de medicamentos que “ajudam” os soropositivos. Além do mais, o longa visa denunciar a quase negligência dessas organizações que escondem resultados prévios de estudos importantes, mostrando a deficiência desse sistema e da sua fiscalização – colocando o dedo na ferida de que qualquer tipo de programa de conscientização é divulgado apenas onde as pessoas não podem ver. A luta, sobretudo, ainda tem um embate sério contra a ignorância da população hipócrita que, em parte, acredita que a AIDS só acontece com homossexuais – como é dito em determinada cena.
A segunda metade do filme traz um rumo bastante diferente do que estava sendo explorando anteriormente. Aos poucos, enquanto 120 Batimentos Por Minuto mostrava os atos ativistas – desde as manifestações públicas para chamar a atenção da mídia até mesmo atos dentro de escolas que não educam sexualmente seus alunos -, o filme vai lentamente focalizando alguns personagens centrais dentro da trama, mostrando o seu “como foi?” ao aprofundar a história de como cada um deles tornou-se soropositivo. Assim, Campillo muda o foco do ativismo para uma visão mais íntima, atraindo a atenção para as consequências da falta de perspectivas que os soropositivos carregam, desacreditados pelo governo e pelas agências farmacêuticas que não mostram um avanço em relação ao estudo da AIDS e trazem consigo as mesmas desculpas esfarrapadas de sempre, omitindo-se ainda de qualquer responsabilidade.
É aí que Nathan (Arnaud Valois) e Sean (Nahuel Perez Biscayart) desenvolvem uma relação de cumplicidade além do amor. Nathan é soronegativo, e Sean soropositivo, e é aí, também, que o longa mostra a consciência de uma edução sexual e da responsabilidade que um apresenta para com o outro ao proporcionarem prazer mútuo de modo seguro – tudo isso apresentado sem pudor ou vergonha em cenas de sexo formidáveis, com méritos da direção em sua realização. No entanto, assim como desenvolve isso, 120 Batimentos Por Minuto torna-se ainda mais denso e traz para o espectador o peso dessa relação, e impacta com a forma (já de conhecimento público) com que a AIDS debilita e definha o soropositivo.
A carga emocional do longa francês chega ao seu ápice neste momento, e esse é o jeito que o filme encontra para mostrar que a luta da Act Up de Paris obviamente não é em vão e precisa ter apoio do governo, da mídia e das empresas envolvidas, que preferem manter isso nas sombras, tentando esconder o problema.
120 Batimentos Por Minuto não poupa diálogos, o texto é denso, mas tudo que é dito precisa de fato ser dito. A consequência de usar esse texto pesado faz com que o filme torne-se exaustivo em determinado momento, mas isso não é um defeito e sim uma escolha que está de acordo com a proposta do próprio filme. A transição do foco de acompanhar o retrato realista e intimista do Act Up para contar de perto o romance de Nathan e Sean soa estranha em um primeiro momento, parecendo que o filme perde seu foco principal, até que se interprete a justificativa real para tal decisão.
Com um olhar intimista do seu diretor, que trabalha bem as nuances do filme com a ajuda do elenco impecável que têm em cena, 120 Batimentos Por Minuto é um filme muito mais importante do que suas características técnicas – que mesmo assim ainda se sobressaem por serem de extrema qualidade -. Mais uma vez o cinema encontra um jeito de fazer um tipo de arte que insere o espectador no mundo real, porém, em uma realidade ao qual ele não costuma ter um grande contato, ou sequer pensar nela.
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