Há sempre uma expectativa básica para todo e qualquer filme dos X-Men: um bom longa de equipe e de boas relações entre os personagens. Os dois primeiros live-actions do grupo de mutantes, lá no início dos anos 2000, traziam isso, Primeira Classe (2011) também.
Com a renovação do elenco e da seleção de personagens em Apocalipse (2016), trazendo Jean Grey, Scott (Tye Sheridan) e Tempestade (Alexandra Shipp) de volta, por exemplo, havia um respiro acompanhado de pequenos lampejos de boas interações entre eles (algo bem próximo do que os fãs dos mutantes acompanharam nos quadrinhos e nas animações exibidas na TV entre as décadas de 1990 e 2000).
Dentro disso, Fênix Negra, o novo capítulo mutante na tela grande, precisava apagar a “imagem” deixada por X-Men 3: O Confronto Final (2006): uma adaptação pouco fiel a uma das sagas mais importantes e conhecidas das HQs da Marvel, além de um filme bastante criticado por suas irregularidades.
X-Men: Fênix Negra, então, é na verdade um emaranhado de boas intenções e tentativas interessantes, mas que no fim traz pouca entrega (de resultados). A dificuldade maior do diretor e roteirista Simon Kinberg, é substituir Bryan Singer, que ao longo dos anos se tornou uma espécie de “dono” da franquia dos personagens no cinema.
Entrar no lugar de Singer, para Kinberg, não se trava de substituir alguém extraordinário, mas sim de dar, quem sabe, uma nova cara para os filmes dos mutantes. Bryan Singer não é o que chamam de um grande diretor, daqueles que trazem um “Q” autoral. Mas seu trabalho com os X-Men se tornou inconfundível, seja no visual, na filmagem, narrativa, trilha sonora. Ou seja, o formato adotado para os filmes destes heróis acabou se tornando inconfundível.
Dentro disso, Fênix Negra parece se perder um pouco. Há, visualmente, essa “assinatura” padrão como nos filmes anteriores, o que já era esperado, pois parte de toda a caminha da equipe nos cinemas contou com algum envolvimento de Kinberg ao lado de Bryan Singer. O porém se encontra na intenção do novo diretor em dar a sua cara para o longa, e no fim acaba sendo uma mescla de duas personalidades diferentes que divergem em tela.
De um lado há o comercialismo de Bryan Singer, ou sua simplicidade, impregnada no DNA do longa. Por outro, há algo mais intimista e diferente, trazido por Kinberg em suas boas intenções. O estreante agrega uma ideia interessante: tratando-se de relações pessoais, ele dá espaço para que os personagens demonstrem suas emoções, e coloca o espectador em um confronto direto com isso.
Por outro lado, a câmera na mão, em meio a determinadas cenas, traz algo mais visceral, que inclusive combina com um ponto bastante positivo do filme: o senso de consequência dos fatos. Simon Kimberg resgata algo muito particular, bem explorado em 2014 no divisor de águas X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido. Na ocasião, o filme trata, além da viagem no tempo, as suas consequências e carrega um senso de gravidade muito consciente.
Outro fato sempre presente nos filmes dos X-Men, ao menos nos últimos quatro lançados (excluindo o que se viu nos longas do Wolverine e em Deadpool), é o final grandioso, carregado de destruição e ação. O final, aqui, é de longe o mais empolgante (do filme). Ao bem da justiça, não é o final propriamente dito, mas sim a sequência que o precede de fato.
Fênix Negra não é o filme que iria desenvolver mais o núcleo não tão jovem apresentado em 2016, afinal trata-se principalmente de Jean Grey (Sophie Turner). Além disso, é claro que o longa precisaria dividir boa parte do seu tempo com os medalhões dessa quadrilogia: James McAvoy (Professor Xavier), Jennifer Lawrence (Mística), Nicolas Hoult (Fera) e Michael Fassbender (Magneto).
É aqui que há uma ruptura na entrega do filme: junto a narrativa, os personagens nem sempre funcionam. O quarteto mencionado acima, desde o filme anterior, não tem mais para onde ir. São personagens cujo desenvolvimento e facetas empobreceram por parte de quem os escreve. Suas “jornadas” dentro deste filme são as mesmas de todos os outros três que foram lançados antes de Fênix Negra.
A narrativa, como dito, é frenética, mas de um modo em que a rapidez com que tudo acontece soa também como desleixo. Os fatos são jogados, tudo acontece muito rápido, sem que haja a chance de se importar com a gravidade do que está acontecendo. Contudo, há um elemento que diminui esse dano: a trilha sonora de Hans Zimmer consegue ser eficiente ao ponto de criar uma atmosfera intensa onde, apesar de não contar tanto com a empatia alheia, consegue ser entendida (isso é realmente grave, é possível pensar, por exemplo).
X-Men: Fênix Negra é um filme palatável em seus acertos e boas intenções, mas não envolve e sequer dá a possibilidade de criar qualquer vínculo emocional. Há, por exemplo, um acontecimento importante cuja inexpressividade não choca, muito menos causa qualquer tipo de emoção. E isso dita muito do que o filme é, pois usa isso como seu combustível principal.
O conflito de Jean Grey e o grande poder que ela carrega é entregue por Sophie Turner. Mas há um equívoco: criar isso sem que haja uma gradualidade fortemente justificável, torna-se, em tela, algo sem qualquer sustância. Embora crível, pelo trabalho da atriz, a previsibilidade da história enfraquece as suas justificativas.
É possível aproveitar alguns bons momentos, os efeitos visuais deslumbrantes em outros podem dar algum conforto, afinal isso é um dos poucos elementos bem resolvidos do filme. Em contrapartida, o restante sofre com as confusões conceituais do seu diretor, com certas cenas de ação deturpadas por uma visão confusa e outras gratificantemente empolgantes.