Como um filme se torna um clássico? Essa pergunta tem várias possíveis explicações. No entanto, para compreender essas respostas é preciso analisar o tempo. Um filme não se torna importante da noite para o dia, e nem só por conta das críticas positivas que recebe da imprensa.
Um filme é um organismo vivo no imaginário popular, e com o passar do tempo a sua onipresença pode lhe dar o status de clássico. Porém, existe ainda um outro espectro desse tipo de longa-metragem: o clássico cult.
Um filme pode ser chamado de cult não apenas pela estética visual e narrativa, ou por romper com as formas hegemônicas do cinema. Longas como Oldboy (2003) se tornam cult a partir do momento em que são cultuados pela audiência. São filmes que se tornam exemplos por algum motivo. E no caso da obra dirigida por Park Chan-wook existem pontos específicos que deram a história de Oh Dae-su (Choi Min-sik) o rótulo de clássico cult.
Na obra lançada originalmente nos cinemas em 2003, – e que retornou às telas no seu aniversário de 20 anos – Oh Dae-su é raptado e mantido em cativeiro por 15 anos. Neste período, recebia alimentação e não tinha contato com o mundo, tendo apenas uma televisão em seu quarto. Repentinamente, o homem é solto e passa a procurar por respostas.
O diretor Park Chan-wook, que também assina o roteiro ao lado de Jo-Yoon Hwang, dá ao desenvolvimento da história contornos intrigantes. A partir disso, o espectador não questiona apenas o que acontece com Oh Dae-su, mas também as escolhas do próprio personagem na medida que o mesmo é confrontado por estas ideias.
Desta forma, uma das genialidades de Oldboy está justamente na forma como Park Chan-wook conduz a história. O filme se torna um marco não apenas porque surpreende o espectador, mas principalmente porque faz pensar sobre a própria forma como o público assistiu a história até a hora do clímax.
Então, não se trata apenas de uma obra base de qualidade – neste caso, o quadrinho criado Caribu Marley – ou de um roteiro bem pensado, mas do conjunto de todos os elementos que contribuem para a imersão do espectador. Esse sucesso passa, sobretudo, pelo entendimento da linguagem cinematográfica e da capacidade que um filme tem de confrontar seu espectador dentro da sala de cinema, ou na sala de casa.
Por ser um organismo vivo e que se comunica diretamente com quem o consome, Oldboy teve 20 anos para maturar o seu status de clássico cult. Fora dos cinemas por um grande período, toda essa experiência teve de ser consumida longe do habitat natural de qualquer longa-metragem. E mesmo assim, sua importância seguiu crescendo. Tudo isso apenas atesta a relevância da obra.
Embora toda a construção do filme seja inteligente, o ato de confrontar tudo aquilo que foi assistido pelo espectador é símbolo de coragem. A história, que é intrigante por si só, se torna ainda mais imersiva a partir do momento em que Oldboy joga limpo com o público.
É com essa catarse que o trabalho de Park Chan-wook ganha novos contornos, momento em que o espectador entende que está diante de um dos grandes filmes do cinema. O que faz Oldboy ganhar o status de clássico cult não é apenas o choque causado pelo conteúdo, mas o total domínio da forma com que essa história é entregue ao público.
O tempo é relativo para muitos filmes. Alguns demoram muito mais do que 20 anos para ganharem reconhecimento. Outros, como Oldboy, são aclamados e contemplados ao longo dos seus primeiros 20 anos de existência. E o percurso traçado pela obra de Park Chan-wook até 2023 é apenas um pedaço da história e um pequeno fragmento da eternidade.