Quando a fumaça branca sai pela chaminé da Capela Sistina no Vaticano, significa que um novo Sumo Pontífice da Igreja Católica foi escolhido. No entanto, o processo que culmina neste momento é, ou era, um grande mistério. Afinal, mesmo famoso, a realização de um conclave é um segredo que só quem participa conhece.
Em Conclave, o diretor Edward Berger (Nada de Novo no Front) coloca o espectador dentro do processo secreto da Igreja Católica logo após a morte de um papa. A ideia vai além de mostrar as etapas de execução de um conclave, mas também de investigar as possíveis influencias da escolha de um Sumo Pontífice, assim como as diferentes visões de mundo entre os cardeais.
Divisões de pensamento na Igreja
Escolher um novo papa é também estabelecer um conflito. Como em qualquer processo eleitoral, os candidatos recebem apoio de eleitores que concordam com as suas ideias. Sorrateiramente, eles tentam convencer indecisos e até opositores.
Assim como o mundo real, Conclave divide essa base entre visões progressistas e conservadoras dentro da igreja. Desta forma, traz para a tela do cinema um conflito semelhante ao da esquerda contra a extrema-direita que domina os principais países do mundo.
Como discurso, as ideias de ambos os lados demonstram fragilidade no texto do roteiro. Mesmo que a estrutura narrativa do longa-metragem seja interessante, o conteúdo não vai além do básico dessa discussão entre conversadores e progressistas. O que pode justificar isso é que, religiosamente, a igreja seja comedida ao demonstrar suas ideias.
No entanto, é esta timidez que faz o filme esconder e pouco discutir a sua grande revelação. Além de pautar a divisão de ideias, Conclave subestima o tamanho das discussões que tenta fazer.
Thriller político
Tudo em Conclave colabora para a criação de um thriller político. Da trilha sonora até a fotografia, o longa-metragem utiliza as técnicas cinematográficas para criar a atmosfera de urgência e gravidade. A história e o seu desenrolar colaboram com isso.
Desta forma, um acontecimento puxa o outro, criando uma cadeira de influencias. Apesar de bem orquestrada, a trama perde potência ao usar como combustível acontecimentos previsíveis. É como se o filme construísse algo totalmente novo, mas entregando nada além do comum.
Corrupção, propina e a busca por segredos do passado são típicos deste tipo de história. A novidade, porém, está no fato de acontecimentos tão humanos – e presentes na política da vida real – também estejam dentro do Vaticano. Ou seja, a surpresa está nos padres utilizando artifícios pecaminosos de pessoas comuns para alcançarem a posição mais importante da igreja.
Presença feminina em Conclave
Enquanto os cardeais vivem o isolamento do conclave, as irmãs trabalham nos bastidores. Não há tramas secundárias para influenciar a decisão da votação, embora personagens tentem utilizá-las para isso. Mas elas estão ali, silenciosas, presentes e observando o que acontece.
São poucas as aparições femininas no filme, mostrando o quão invisíveis as irmãs são diante da grandeza dos cargos dos homens e, em especial, para o ego que eles alimentam.
As competências de Conclave
Conclave é um thriller político competente. Tecnicamente, o filme traduz a gravidade do que acontece na imagem, em especial na forma como exibe os personagens em tela. A trilha sonora é essencial na construção da atmosfera da trama.
Na direção, Edward Berger entende que, além do ritmo, precisa dar tempo à Conclave. Desta forma, mostra o impacto do que acontece não apenas na sequência dos fatos, mas principalmente nos personagens que podem sentir o peso daquilo que descobrem e das decisões que precisam ser tomadas.
O elenco liderado por Ralph Fiennes, que interpreta o Cardeal Lawrence, sustenta o peso da história. Fiennes, indicado ao Oscar de Melhor Ator, destaque-se ao viver um personagem em conflito com a própria fé. O peso do dilema somado a seriedade do momento e às responsabilidades atribuídas ao cardeal estão na pele do ator.
Embora utilize artifícios comuns para mover sua história, Conclave surpreende por mostrar que dentro da igreja os processos funcionam como na vida ordinária. Antes de qualquer título que possam ter, os membros do alto escalão católico são pessoas como todas as outras. Mesmo previsível, o filme surpreende por ser o que é.