Springsteen – Salve-Me do Desconhecido | Crítica

Dirigido por Scott Cooper, filme viaja pela melancolia do artista que descobriu a depressão no momento mais importante da carreira.

Imagem do filme Springsteen - Salve-Me do Desconhecido
Jeremy Allen White como Bruce Springsteen no filme Springsteen - Salve-Me do Desconhecido. | Imagem: Cortesia da 20th Century Studios.

O começo da década de 1980 foi importante para que Bruce Springsteen se tornasse uma lenda da música. Esse momento, que dividiu a vida do artista entre antes e depois, é contado intimamente em Springsteen: Salve-me do Desconhecido. A cinebiografia narra um pequeno pedaço determinante da vida do cantor, com a realização do álbum “Nebraska”, em 1982, e posterior diagnóstico de depressão do intérprete.

Springsteen: Salve-Me do Desconhecido se junta a um grupo recente de cinebiografias que tentam ser menos convencionais do que os exemplares habituais do gênero. Isso começa com a atuação de Jeremy Allen White e o visível esforço do ator em desempenhar o papel, fosse nas cenas em cima do palco, nas que envolviam apresentações musicais ou quando acessava os sentimentos mais profundos do cantor.

Para explicar este retrato, o subtitulado Salve-Me do Desconhecido convida os espectadores a entenderem as camadas das dores que perturbavam Bruce Springsteen através do passado conturbado que viveu. A relação com o pai e a família na infância ajuda a construir a estrela do rock que nunca se comportou como um rockstar de verdade. O ritmo de Springsteen era diferente e, no filme, é possível entender o motivo.

Com um olhar sensível para esta figura, Springsteen não passa por uma jornada de redenção na história. A trama, e a vida do artista, fogem dos maneirismos convencionais. Não há um romance que dá certo no final. Em certo momento, um diálogo deixa claro o que o filme pretende mostrar: “só estou tentando achar algo real no meio do barulho“.

Imagem do filme Springsteen - Salve-Me do Desconhecido
Jeremy Allen White como Bruce Springsteen no filme Springsteen – Salve-Me do Desconhecido. | Imagem: Cortesia da 20th Century Studios.

Salve-Me do Desconhecido, portanto, não tinha interesse em transformar o protagonista em um personagem fictício ao seguir passos hegemônicos da construção de personagem. Ao contrário disso, o diretor Scott Cooper está interessado na humanidade de Bruce, não no artista, mas no homem falho que tentava entender os lugares profundos do próprio interior que passou a acessar quando questionou a própria existência e examinou seu passado.

Com o apelo de retratar um recorte da vida de um grande astro, seria natural que um filme de qualidade, com nomes de peso no elenco, voltasse a sua intencionalidade na temporada de premiações. Springsteen – Salve-Me do Desconhecido não nega isso e evidencia seu elenco em cenas próprias para os VTs de possíveis indicações.

Embora a estratégia seja perceptível, o diretor encontra equilíbrio para que o filme não descambe para um oscarbait barato. A história, que carrega recados importantes sobre saúde mental, se mantém fiel às próprias características até o final. Mesmo sem evitar um tom panfletário, mas digno por mostrar a necessidade de procurar ajuda quando for preciso, o Springsteen – Salve-Me do Desconhecido leva o público a compreender o somatório de experiências que resultaram no Bruce Springsteen do tempo presente retratado no longa-metragem.

Com enfoque nos personagens masculinos, Scott Cooper procura extrair o melhor do material humano que está à sua disposição. Jeremy Allen White, que dá vida ao protagonista, cantou e tocou gaita em cena, um esforço notável principalmente quando, após as apresentações, a voz do ator falha dado o esforço realizado. Jeremy Strong no papel do empresário Jon Landau e Stephen Graham como pai de Bruce – este último em um ano especial depois do sucesso estrondoso de Adolescência – também se sobressaem ao orbitarem a vida da figura central do filme.

Imagem do filme Springsteen - Salve-Me do Desconhecido
Jeremy Allen White como Bruce Springsteen e Odessa Young como Faye no filme Springsteen – Salve-Me do Desconhecido. | Imagem: Cortesia da 20th Century Studios.

Embora as personagens femininas não ganhem tanto destaque, Faye, vivida por Odessa Young, aparece na vida de Bruce como um cometa. Sua participação evidencia as inconstâncias, fragilidades e medos de um Springsteen que demonstra os primeiros sinais da depressão. Mesmo sem a intenção de embarcar em jornadas pessoais secundárias, o diretor encontra nestes personagens pequenas maneiras de demonstrar o quanto as pessoas no entorno de quem tem depressão podem ser afetadas, seja pela impotência de querer ajudar e não saber o que fazer ou pela dor da ausência sem explicação que cria lacunas emocionais em quem teve um vislumbre do que poderia ter e não teve.

Springsteen – Salve-Me do Desconhecido incentiva a busca por ajuda em momentos difíceis, mas se esforça para entregar mais do que uma mensagem. O filme de Scott Cooper, baseado no livro “Deliver Me from Nowhere: The Making of Bruce Springsteen’s Nebraska” (2023), de Warren Zanes, é eficiente ao explorar as camadas do seu personagem, utilizando o passado para justificar as feridas abertas que levaram o protagonista a uma viagem melancólica pela própria vida. Regado a grandes sucessos, o longa pode ser um deleite para os fãs e uma boa apresentação para quem ainda não é admirador do trabalho de Bruce Springsteen.

Assista ao trailer de Springsteen: Salve-Me do Desconhecido

– Siga a Matinê nas redes sociais: InstagramThreadsFacebookTikTokYouTube.