A Casa do Dragão
Rhys Ifans como Otto Hightower em A Casa do Dragão. | Crédito: Reprodução / IMDb.

O segundo episódio de A Casa do Dragão (House of the Dradon, HotD) mostrou a criação e a execução de um plano ousado dos Verdes. Após a morte do Príncipe Jaehaerys II – que teve a cabeça cortada por Sangue e Queijo a mando de Daemon Targaryen (Matt Smith) -, Otto Hightower (Rhys Ifans) sugere ao Rei Aegon II (Tom Glynn-Carney) uma exibição pública do luto e do sofrimento da coroa.

No momento da sugestão, o Rei e os membros do Pequeno Conselho não sabiam quem tinha mandado os assassinos executar o crime. A ideia de Otto Hightower era culpar Rhaenyra Targaryen (Emma D’Arcy), pretendente ao Trono de Ferro – a personagem foi nomeada herdeira do comando de Westeros na 1ª temporada.

Contexto

Depois que Aemond Targaryen (Ewan Mitchell) e Vhagar mataram Lucerys Velaryon (Elliot Grihault), Rhaenyra queria vingança para o filho em um momento de ódio. No episódio de estreia da 2ª temporada, a rainha por direito procurava algo concreto para sair do estado de negação sobre a perda de Luke. Depois de encontrar o pedaço de uma asa de Arrax, o dragão do garoto, e roupas do filho, Rhaenyra retornou para Pedra do Dragão e disse “eu quero Aemond Targaryen”.

Faminto para agir, Daemon conspirou com Mysaria (Sonoya Mizuno), sua antiga amante, para encontrar algum soldado fiel do tempo em que ele comandava os Mantos Dourados em Porto Real. O seu plano era de matar Aemond ou ter a vingança da rainha realizada – “um filho por um filho”. Contudo, Rhaenyra sequer sabia da existência de tal plano e tampouco havia ordenado o assassinato do príncipe – que era seu sobrinho.

Fake News, desinformação e manipulação da opinião pública

A operação idealizada por Otto Hightower é um movimento semelhante ao que acontece com as fake news (“notícia falsa” em tradução livre). Embora existam muitos debates sobre o termo – afinal, no jornalismo, a notícia é um texto informativo sobre fatos, então, se fake é uma mentira, logo não é notícia -, a mecânica de sua operação apresenta semelhanças com o plano e intenção da Mão do Rei.

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Pequeno Conselho reunido no episódio intitulado “Rhaenyra a cruel” da 2ª temporada de ‘A Casa do Dragão’. | Crédito: Reprodução / IMDb.

A propagação de uma fake news é rodeada de intenções. Entre eles, destacam-se causar desorientação, espalhar inverdades, promover histeria e desordem, abalar estruturas democráticas, prejudicar algo ou alguém e desinformar.

Existem ainda outros debates no campo acadêmico que ultrapassam as reflexões do termo, mas abrangem também o significado e as diferenças do que é comumente chamado de fake news com desinformação, mentira, informação fora de contexto, entre outros. A partir deste significado inicial, e pensando no plano de Otto Hightower, as semelhanças do seriado com o mundo real começam a aparecer.

A ideia de um cortejo fúnebre servia para mostrar o sofrimento da Rainha Helaena (Phia Saban) e da Rainha-viúva Alicent (Olivia Cooke) para os cidadãos de Porto Real. Além disso, um porta-voz da coroa estava na frente da procissão proferindo as seguintes palavras: “Contemplem o feito de Rhaenyra Targaryen. Pretendente ao Trono. Assassina de parentes. Profanadora de inocentes”.

Com essas palavras, o movimento feito pela coroa demonstra duas intenções: prejudicar a imagem da pretendente ao trono e manipular a opinião pública. Desta forma, a reivindicação de Rhaenyra ao Trono de Ferro não teria apoio do povo.

A Casa do Dragão
Alicent (esquerda) e Helaena (direita) em cena de A Casa do Dragão. | Crédito: Reprodução / IMDb.

Além disso, os Meistres de Porto Real enviaram corvos para as principais casas do reino falando que a filha de Viserys mandou matar o próprio sobrinho. Com isso, a coroa conseguiria enfraquecer a imagem e a reivindicação de Rhaenyra diante do povo e dos Lordes de Westeros. Esta ação torna ainda mais difícil a busca por apoiadores para a causa da herdeira do Trono de Ferro.

A questão toda é que o crime partiu de uma ação escondida de Daemon depois de ouvir que Rhaenyra queria Aemond Targaryen. A fala da rainha, em um momento de ódio pela morte de Lucerys era tudo o que Daemon queria para agir.

Fica evidente que os Verdes, lado de quem usurpou o Trono de Ferro, não têm a informação completa. Mesmo assim, decidem usar a morte do príncipe a seu favor, manipulando o ocorrido para promover a desordem. Otto Hightower, inclusive, falou que não importa qual é a verdade, mas sim a oportunidade que eles têm em mãos.

Ao longo do episódio, Larys Strong (Matthew Needham) informou que a Guarda Real prendeu um soldado dos Mantos Dourados contratado por Daemon para matar Jaehaerys. Diante de ferramentas de tortura em uma prisão na Fortaleza Vermelha, o homem confessa o crime e diz que foi contratado por Daemon Targaryen.

Essa informação confirma a hipótese criada por Otto Hightower, mas com ressalvas. Neste contexto, mesmo com o criminoso confessando o crime, pouco importa se o assassinato foi ordenado por Rhaenyra ou não. Daemon é marido dela e está ao seu lado na guerra. Embora o episódio mostre que a rainha não sabia, no fim, ela acaba levando a culpa.

Além de entretenimento

A Casa do Dragão
Emma D’Arcy como Rhaenyra Targaryen em cena de ‘A Casa do Dragão’. | Crédito: Reprodução / IMDb.

Desde a 1ª temporada, A Casa do Dragão usa temas sensíveis do mundo real em sua história. Um exemplo disso é o conservadorismo religioso representado por Alicent Hightower e que está se tornando um falso moralismo na nova leva de episódios.

A informação é uma arma poderosa e letal, principalmente para quem tem o controle das narrativas que criam-se a partir de sua disseminação. É claro que a mentira, a inverdade e outros sinônimos se diferem do que é fato ou verdade.

A Casa do Dragão, mais uma vez, se torna um bom exemplo de como o entretenimento pode ser mais do que diversão. Isso acontece quando a ficção traz exemplos práticos do que acontece no mundo real para dar ao espectador ferramentas para pensar em assuntos importantes – como a disseminação de desinformação e de como elas podem manipular a população.

Embora seja uma série rodada na Europa, A Casa do Dragão é assistida em escala mundial. O problema da desinformação e das fake news atinge a sociedade em proporções semelhantes ou até maiores.

Ao final de cada episódio, os espectadores do streaming Max podem assistir entrevistas da produção e elenco comentando o que foi assistido. No bastidor do segundo capítulo, Rhys Ifans, intérprete de Otto Hightower, falou sobre o plano do personagem: “É uma forma de manipular a população com informações falsas […], no trabalho do Otto, é uma arma a ser usada em termos de opinião pública”.

A Casa do Dragão, assim como outras produções, traz para dentro da sua história problemas do mundo real. Independente da temática abordada, cada série ou filme também faz, de alguma maneira, um retrato do seu tempo. Temas como disseminação de desinformação, manipulação da opinião pública, conservadorismo religioso, entre outros, fazem parte do que o mundo da onde parte as mentes por trás de filmes e séries.

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Sou jornalista, fundador e editor da Matinê Cine&TV. Escrevo sobre cinema e séries desde 2014. No jornalismo tenho apreço pelo cultural e literário, além de estudar e trabalhar com podcasts. Além dos filmes e séries, também gosto de sociedade e direitos humanos.