Anthony Hopkins em cena de Meu Pai, ator recebeu uma indicação na categoria de Melhor Ator no Oscar 2021 para esta atuação | Imagem: California Filmes

Existem inúmeras maneiras para contar uma boa história. No cinema, todos os elementos dão suporte para que um enredo se construa. No material final, alguns aspectos ficam mais evidentes do que outros. Dito isso, Meu Pai, filme de estreia do escritor e roteiristas francês Florian Zeller, tem na edição e montagem os seus principais aliados.

No filme, Anthony Hopkins vive um senhor de 81 anos que tem a capacidade de viver sozinho descartada na medida em que faz confusões sobre a sua rotina. Olivia Colman é a filha que cuida do pai. Essas duas informações são as únicas mais próximas de uma verdade absoluta sobre a história. Meu Pai (The Father no original) tinha dois caminhos para seguir: o óbvio e piegas (sem Oscar) e o diferenciado, seja lá o que isso significar para o diretor (e com possível Oscar).

Meu Pai soma seis indicações ao Oscar 2021, são elas: Melhor Filme, Melhor Design de Produção ou Direção de Arte, Melhor Edição (categoria que agora une edição e montagem dos longas-metragens), Melhor Ator para Hopkins, Melhor Atriz Coadjuvante para Colman e, por fim, Melhor Roteiro Adaptado. Receber nomeações em categorias principais e técnicas conota que este é um bom filme, sobretudo a respeito das suas atribuições individuais na formação de um todo (a obra cinematográfica).

Para Meu Pai, a vitória em alguma dessas categorias é difícil. Em roteiro adaptado, por exemplo, a disputa fica entre Nomadland e Borat: Fita de Cinema Seguinte – o segundo com mais vantagem, pois venceu o prêmio do Sindicato dos Roteiristas, um dos termômetros para o Oscar. As mesmas chances se repetem nas outras nomeações. Se existe alguma possibilidade de estatueta para Meu Pai, talvez ela esteja em Design de Produção ou Edição, dois elementos cruciais para a realização do filme.

Para um trabalho de estreia, Meu Pai é um longa-metragem audacioso dentro do seu pequeno escopo. Embora quase toda a história aconteça em um apartamento, o filme constrói uma atmosfera perturbadora. Sua história, na verdade, é bastante inquietante.

Falar sobre um homem de idade que não é mais capaz de viver sozinho e ao mesmo tempo construir esse enredo dando ao espectador o poder da dúvida, é o grande trunfo de Meu Pai. Com isso, o filme inverte qualquer expectativa que alguém possa criar sobre ser um drama emocionante. Meu Pai foge de sentimentos como a comoção, pois explora o lado mais assombroso de perder o controle da própria vida.

Olivia Colman em cena do filme “Meu Pai”, longa pelo qual ela recebeu uma indicação de Melhor Atriz Coadjuvante no Oscar 2021 | California Filmes

Na história, existe uma dualidade que se encaixa quando Anthony, personagens de Hopkins, pode estar sendo engano pela filha. Ela quer ir morar em Paris com o novo namorado e colocar o pai em uma casa de repouso. Dar essa dúvida para os espectadores é uma cartada certeira de Meu Pai. Ao assistir o filme, o público pode ficar confuso com o que vê em tela, e essa sensação dúbia pode fisgar os mais interessados na trama.

A montagem colabora com todas essas sensações. A narrativa abstrata e não convencional leva os 97 minutos de filme a um constante emaranhado de perguntas. Não é sobre ser real ou não, mas sim sobre qual a ordem dos fatos e suas verdadeiras intenções. O pano de fundo é a linha tênue e delicada de filhos que precisam lidar com pais idosos e próximos do fim de suas vidas. Meu Pai segue pelo caminho mais interessante e ousado.

O roteiro é perspicaz. Ele faz com que Anthony Hokpins leva seu personagem do céu ao inferno em segundos. A atuação é de um talento brutal. O que Anthony (personagem) vive ao longo da hora e meia de filme dá ao público diversão, inquietação e perplexidade. Afinal, o senhor de 81 anos está sendo engano?

Meu Pai leva o espectador a uma implosão de sentimentos e questionamentos sobre sua história. O carisma e a forma que Hopkins e Olivia Colman colocam as suas presenças em cena agregam ainda mais a essa experiência. Mas o que o vencedor do Oscar de Melhor Ator Coadjuvante por O Silêncio dos Inocentes (1991) entrega em Meu Pai é certamente uma das atuações mais excitantes desta temporada de premiações.

Anthony Hopkins em cena do filme “Meu Pai” | Imagem: California Filmes

Confusamente prazeroso, desconfortável com precisão e inesperadamente intrigante, Meu Pai subverte as expectativas sobre sua história. Ao fugir dos aspectos mais recorrentes do gênero, Florian Zeller cria nesta obra uma mistura entre os departamentos de arte e edição que valorizam a genuinidade do seu protagonista. A narrativa positivamente deturbada pela montagem é responsável pelos momentos mais inquietantes da produção.

Avaliação
Ótimo
8.5
COMPARTILHAR
Sou jornalista, fundador e editor da Matinê Cine&TV. Escrevo sobre cinema e séries desde 2014. No jornalismo tenho apreço pelo cultural e literário, além de estudar e trabalhar com podcasts. Além dos filmes e séries, também gosto de sociedade e direitos humanos.