Projeto idealizado por décadas pelo diretor Michael Mann, Ferrari chega aos cinemas transformando o sonho do cineasta em realidade. O longa-metragem é estrelado por Adam Driver e Penélope Cruz, e conta ainda com o brasileiro Gabriel Leone no elenco.

Ficha técnica

Título: Ferrari
Direção: Michael Mann
Roteiro: Troy Kennedy Martin
Elenco principal: Adam Driver, Penélope Cruz, Shailene Woodley, Gabriel Leone, Sarah Gadon, Jack O’ Connell, Patrick Dempsey e Daniela Piperno 
Data de lançamento: 22 de fevereiro de 2024 (nos cinemas brasileiros)

A história de ‘Ferrari’

O filme mostra os bastidores da Fórmula 1 em 1957, quando o ex-piloto Enzo Ferrari (Adam Driver) está em crise. A falência assombra a empresa que ele e a esposa, Laura, construíram uma década atrás. Seu casamento instável é ainda mais abalado pela perda do único filho do casal e o relacionamento com Lina Lardi. Ele decide contrapor essas perdas apostando tudo em uma corrida – a icônica Mille Miglia, na Itália.

Assista ao trailer do filme:

Crítica de Ferrari

Em 1993, o diretor Michael Mann já tinha a intenção de comandar uma cinebiografia de Enzo Ferrari. A ideia primordial tinha Robert De Niro como protagonista, mas os dois trabalharam juntos em 1995 no filme Fogo Contra Fogo.

Ao longo dos últimos 30 anos, Michael Mann dirigiu outros filmes e teve tempo para pensar em Ferrari. Com o passar deste período, o longa-metragem ganhou contornos de um filme dos sonhos do cineasta.

Em 2015, Christian Bale tinha sido escalado para o papel principal, o que posteriormente não se concretizou por conta da agenda do ator – que não teria tempo suficiente para ganhar o peso necessário. Logo em seguida foi a vez de Hugh Jackman ser escalado. No entanto, em 2022 foi substituído por Adam Driver.

Vendo este histórico, o que poderia ser um filme dos sonhos acabou sendo uma espécie de pesadelo.

Um filme que enfim existe

Após tanto tempo, é possível se abraçar a ideia de que entre um filme e outro Michael Mann se dedicou a este projeto. Então, Ferrari tinha tudo para beirar a excelência. Embora Troy Kennedy Martin, que assina o roteiro da obra tenha falecido em 2009, o roteiro do longa-metragem está pronto há pelo menos 15 anos. Tempo suficiente para ser revisado, inúmeras vezes, pelo diretor – fato que realmente aconteceu.

Na prática, Ferrari se distancia do ideal. Michael Mann apresenta um material profundo sobre um momento específico da vida de Enzo Ferrari. Em 1957, a Ferrari – fundada por ele e sua esposa Laura (Penélope Cruz) – estava à beira da falência. Para salvar seu nome e a marca de carros, o ex-piloto e empresário precisa vencer a principal corrida do campeonato.

Ferrari filme
Adam Driver em cena do filme ‘Ferrari’. | Crédito: Divulgação / Diamond Films.

Tudo isso acontece quando a vida pessoal de Enzo Ferrari passa por seus momentos de maior turbulência. O casamento com Laura está caótico, principalmente por causa da morte do filho. E, além disso, Ferrari mantém uma segunda família com Lina Lardi (Shailene Woodley), com quem teve um filho. Enlutado e divido entre as duas famílias, o protagonista se vê obcecado pela vitória que pode salvar sua empresa.

Com esta história, Michael Mann divide o filme em três núcleos. O primeiro, trabalha a figura de Ferrari como chefe da equipe. O commendatore, como é chamado, é um estrategista genial que procura vender carros de luxo para financiar o esporte de velocidade. Ao mesmo tempo, tenta ser um pai e amante atencioso para Lina e Piero. E no fim, é um marido distante e bruto para Laura.

Todos estes núcleos compõem um personagem multifacetado, uma figura digna de um estudo aprofundado. No entanto, narrativamente, Michael Mann não explora nada além do convencional. O diretor esbanja elegância e cadência em sua direção, buscando um equilíbrio entre aprofundar a visão sobre Enzo Ferrari com a tentativa de uma ação eletrizante de carros velozes da década de 1950.

Na ação, Mann também não arrisca. Ferrari é um filme tradicional, que não arrisca em fórmula ou em formato. E em suas mais de duas horas, o longa-metragem consegue despertar o interesse – apesar de não ser arrebatador.

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Adam Driver e Penélope Cruz em cena do filme ‘Ferrari’. | Crédito: Divulgação / Diamond Films.

A montagem de Ferrari é o que mais destoa de todas as tentativas frustradas do diretor em acertar o alvo da excelência. Se por um lado há um estilo elegante na direção, por outro faltou este mesmo toque na hora de encaixar peça por peça deste quadro. Por vezes, a montagem de Ferrari não justifica escolhas que se prolongam sem motivo.

Enquanto algumas destas escolhas infelizes se desenrolam em tela, os atores chamam a atenção dos olhos de quem assiste. Mann dá tempo para que, principalmente, Adam Driver e Penélope Cruz demonstrem ao público uma erupção de sentimento a cada cena em que aparecem. Cruz, inclusive, foi indicada ao SAG Awards (prêmio do Sindicato dos Atores) na categoria de Melhor Atriz Coadjuvante. A atriz é, ainda, a presença mais potente da obra.

O brasileiro Gabriel Leone, que estrelou a série Dom, também chama a tenção com um obstinado Alfonso de Portago, piloto espanhol que integrou a equipe da Ferrari. O ator é, sem dúvida, um dos principais talentos de sua geração e justifica o rótulo mais uma vez.

Entre pontos negativos e positivos, Ferrari tem êxito no retrato da insegurança e incerteza que cercava os pilotos de corrida daquela época. Os carros não tinham aparatos de segurança, as roupas eram comuns, e capacetes e óculos eram o escuto que não os protegeria de um acidente fatal.

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Jack O’Connel (esquerda) e Gabriel Leone (centro) em cena do filme ‘Ferrari’. | Crédito: Divulgação / Diamond Films.

Antes de ingressarem em uma corrida os pilotos escreviam cartas para suas companheiras. Nos recados, o principal desejo era de não deixá-las. Na época, ser piloto de carros de alta velocidade era uma profissão cercada por fama e perigos mortais. A Mille Miglia, corrida retratada no filme, era famosa por acidentes violentos e tinha um número considerável de vítimas a cada edição.

Ferrari não é o tipo de filme que será lembrado no final de 2024, ou de qualquer outro ano. Talvez seja referência para a filmografia do seu diretor e o dia em que ele não alcançou o que desejava.

Apesar disso, não há desprezo para Ferrari. O que fica é um filme comum, que escolhe os caminhos mais convencionais para narrar sua história. Michael Mann, que há muitos anos desejava a realização deste longa-metragem, leva às telas uma história onde ele mesmo não arrisca o diferente. Não é um desperdício, mas há neste filme um material profundo, intenso e interessante sobre a vida de Enzo Ferrari.

Avaliação
Regular
6.0
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Sou jornalista, fundador e editor da Matinê Cine&TV. Escrevo sobre cinema e séries desde 2014. No jornalismo tenho apreço pelo cultural e literário, além de estudar e trabalhar com podcasts. Além dos filmes e séries, também gosto de sociedade e direitos humanos.