Há sempre um momento em que a trama de The Boys chega ao ponto de fazer o espectador não saber para onde ela vai. No ano um, isso foi um problema porque o seriado demorou para mostrar o seu propósito. Mas no segundo, não ter para onde ir, ou caminhar até o “e agora?”, foi ótimo para a série.

The Boys tem um discurso muito forte e consciente sobre política, capitalismo, redes sociais e intervenção divina. Vez ou outra parece que todo o resto é só pano de fundo, pois cada ponto citado na frase anterior é determinante para que a série seja o que é. Na segunda temporada, retomando o pensamento, o programa deixou os seus personagens encurralados e quase sem esperança na luta contra a Vought.

A trama principal e as subtramas se completam ao longo dos episódios. Enquanto enredos secundários servem para desenvolver mais os personagens, o centro da história não caminha sem que essa outra parte a acompanhe. É como se as linhas não pudessem existir sem as entrelinhas – com ambas se encontrando no fim. Por exemplo, sem Ryan (Cameron Crovetti), o filho do Capitão Pátria (Antony Starr), o herói não teria metade do seu background.

Na época em que a cultura pop se encontra atolada de super-heróis, The Boys é uma das melhores opções. Mas é importante ressaltar: a série do Prime Video faz uma mescla das identidades de Marvel e DC, ou do que deu certo para uma e outra, tornando a combinação algo próprio, referencial e satírico – tudo ao mesmo tempo. Trazer os super para o mundo real nunca foi tão realista.

Tudo em The Boys fica mais interessante quando a série propõe uma ressignificação do heroísmo como se conhece. “Vocês são os heróis” aparece vez ou outra no texto dos episódios. É como se o roteiro se materializasse em zombaria ao patriotismo norte-americano que reconhece como heróis os seus militares que lutam guerras, que muitas vezes, não lhes pertencem. E isso acontece enquanto os fãs dos super idolatram figuras que eles mesmos desconhecem – para além das imagens forjadas nas mídias sociais e nos seus próprios filmes.

“As pessoas adoram o que eu tenho a dizer. Elas acreditam nisso. Só não gostam da palavra ‘nazista’”, disse Tempesta (Aya Cash) na reta final do oitavo episódio, como se estivesse coberta de razão em chamar os seus ex admiradores de hipócritas. Suas ideias conservadoras encorajavam e representavam o povo, que simpatizava com tais pensamentos. Tudo parecia revolucionário até se descobrir que por trás daquelas palavras estavam os ideais genocidas e arianos que fundaram um dos lados da Segunda Guerra. The Boys é a arte imitando a vida – seja ela vivida no Brasil ou nos Estados Unidos. Mas na ficção o mundo acorda vê a verdade.

Capitão Pátria (esquerda) e Maeve (direita) em cena de The Boys | Crédito: Reprodução/IMDb

The Boys é um retrato realista sobre o mundo, em uma roupagem ficcional impulsionada pelo que hoje move o entretenimento, os super-heróis. A segunda temporada é o momento em que a série do Prime Video consegue se consolidar como uma das grandes atrações da televisão/streaming. Seus números de audiência se justificam ao desafiar a concorrência. Se seguir neste ritmo, Os Garotos e Os Super devem reservar surpresas muito boas para a terceira temporada.

Além do mais, é bom quando uma série de qualidade responde perguntas com novas questões. A curiosidade que o público tanto queria saciar sobre quem explodiu as cabeças no sétimo episódio, e também lá no começo da temporada, veio de um jeito açucarado. Foi como se o doce acabasse no melhor momento. E é dessa maneira que The Boys termina, com o famoso “gostinho de quero mais”.

Avaliação
Ótima
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Sou jornalista, fundador e editor da Matinê Cine&TV. Escrevo sobre cinema e séries desde 2014. No jornalismo tenho apreço pelo cultural e literário, além de estudar e trabalhar com podcasts. Além dos filmes e séries, também gosto de sociedade e direitos humanos.