Cena do filme "Medusa", em cartaz nos cinemas a partir desta quinta-feira, 16. | Imagem: Divulgação / Vitrine Filmes.

Em um futuro distante e distópico, um grupo de mulheres – conhecidas também como As Poderosas do Altar – utiliza máscaras para reprimir e agredir jovens julgadas como promíscuas. As valentonas fazem isso porque enquanto há luz no dia, seguem a doutrina religiosa que faz com que elas sejam o retrato perfeito de bela, recatada e do lar, ou submissa como elas dizem. Com isso, as evangélicas prezam por sua beleza preservada por maquiagem leve e são comportadas de acordo com as regras da igreja.

Embora seja ficção e trate a história como distopia, Medusa não deixa de ter uma ponta de verdade quando dialoga sobre fanatismo religioso. O mesmo acontece quando a trama aborda a violência doméstica com uma de suas personagens.

Medusa é o segundo longa-metragem de Anita Rocha da Silveira, cineasta que comandou Mate-me Por Favor (2015). Em seus dois longas há pequenas similaridades, além de alguns membros do elenco, existe uma clara alusão de cores, tons, iluminação e trilha sonora. A diretora disse à imprensa recentemente que a ideia era de homenagear filmes de terror da década de 1970 e 1980, além de revelar que Suspiria, de Dario Argento, é a principal referência de Medusa.

Para a cineasta, mesmo tratando de temas duros, estes filmes não se levam totalmente a sério e trazem também momentos de leveza. Essa ideia fica muito clara no filme. Nem tudo é violência e perseguição. Principalmente quando a protagonista Mariana (Mari Oliveira) embarca em uma jornada de reflexão sobre a própria vida e descoberta da sua sexualidade.

A história trata o mito da Medusa como um fio condutor da sua narrativa. Dito isso, é possível afirmar que Bruna Linzmeyer interpreta uma espécie de personificação da figura mitológica. Julgada como a mulher mais depravada da história pela líder das Poderosas do Altar, Melissa (Linzmeyer) teve o rosto queimado por conta de sua sensualidade e charme, servindo de exemplo do que as mulheres da igreja não deveriam ser.

No entanto, fica muito evidente que para algumas dessas personagens as ações de Melissa não eram erradas e o sentimento que nutrem, na verdade, é o de inveja. Desta forma, elas abominam exatamente aquilo que elas não têm liberdade para ser. Embora haja esta impressão, há também outras personagens totalmente entregues e crentes nos ditos da igreja.

Cena do filme “Medusa”, em cartaz nos cinemas a partir desta quinta-feira, 16. | Imagem: Divulgação / Vitrine Filmes.

Além da história e de todas as suas camadas, o esforço estético visual e sonoro da produção para criar a ambientação da história em uma realidade alternativa mostra a competência da diretora e da equipe envolvida com a produção. As referências são claras e muito bem homenageadas. O tom verde que predomina a cinematografia é uma alusão a natureza e a Medusa, informação confirmada pela cineasta.

É interessante como a técnica e a execução do roteiro andam alinhados ao longo da projeção. Medusa visa mostrar e refletir sobre um Brasil atual, afinal foram fatos reais que inspiraram a diretora a criar esta história. No entanto, é importante ressaltar que o recorte religioso do filme não é generalista, mas fala de um grupo muito específico de fanáticos. A partir disso, o longa-metragem mostra até onde cada um é capaz de ir para defender aquilo que acredita, independente de qualquer leitura individual sobre certo, errado ou a partir de que momento os limites são ultrapassados.

Com camadas intensas e cenas instigantes, Medusa faz o espectador embarcar em sua narrativa visual. Traz interpretações vibrantes e fisicamente muito potentes. Suas personagens conduzem a trama e entregam ao espectador jornadas poderosas. Mas acima de qualquer coisa, a direção de Anita Rocha da Silveira é o ponto-chave do filme, pois sua percepção do mundo é crucial para que Medusa seja o que é.

Avaliação
Ótimo
8.0
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Sou jornalista, fundador e editor da Matinê Cine&TV. Escrevo sobre cinema e séries desde 2014. No jornalismo tenho apreço pelo cultural e literário, além de estudar e trabalhar com podcasts. Além dos filmes e séries, também gosto de sociedade e direitos humanos.