Série Euphoria
Imagem: Reprodução/IMDb

A HBO é sem dúvida uma das emissoras que mais produz conteúdo de qualidade, sejam séries, minisséries ou telefilmes. O canal, quase sempre, consegue acertar nas suas escolhas e emplaca, todos os anos, produções que esbanjam qualidade no conjunto da obra.

Questionou-se, recentemente, o que poderia dar ao canal uma espécie de sobrevida após o final de Game of Thrones – considerando, ainda, a sua grande aposta em Westworld, que não atingiu o mesmo público massivo da fantasia medieval. No entanto, as apostas da HBO falam por si só. Chernobyl começou quando a última temporada GoT ainda estava no ar, e com o seu fim a minissérie tomou conta da audiência – por mérito próprio e também pela fome de um público que não sabia como seriam as suas noites de domingo após o fim de Game of Thrones.

Depois dela veio o retorno de Big Little Lies, outro grande sucesso da HBO encabeçado por atrizes renomadas e contando com a adição, “apenas” de Meryl Streep. Junto a nova temporada de BLL, chegou também uma interessante série com temas atuais estrelada por Zendaya – além de que, antes do seu lançamento, já havia causado polêmica.

Euphoria, assim, trilhou um caminho surpreendente, pois dificilmente o público que a série cativou nas últimas semanas esperava tanta qualidade. Dentro disso, deve-se considerar que Euphoria poderia seguir uma linha já traçada por dramas mundanos que retratam a vida de um grupo de pessoas – séries com esse estilo são recorrentes, e precisam ter um diferencial que as faça serem lembradas.

A nova série da HBO, cuja segunda temporada já foi confirmada, não precisou de muito para se distinguir das demais. Claro que não foi apenas o histórico de boas produções do canal que fez Euphoria alcançar a seu próprio holofote. O conjunto que a obra constrói ao longo dos seus 8 episódios justifica o sucesso e a aclamação.

Série Euphoria
Imagem: Reprodução/IMDb

Euphoria traz uma visão contemporânea para a história que acompanha esse mesmo ideal (de contemporaneidade). Cada episódio é introduzido por um pequeno resumo sobre a vida de cada um dos personagens – algo visto, por exemplo, em American Gods, que partia com pequenas histórias dos Deuses nórdicos antes de cada capítulo.

A série mostra ao espectador a profundidade desses personagens, afinal, a vida de cada um deles é um espectro – o conceito abordado pela série em relação a sexualidade também se aplica nas outras áreas da vida cotidiana de cada um deles.

Euphoria trata de temas relevantes de um jeito diferente dos demais programas. Sua contemporaneidade é o que mais se destaca. E com essa abordagem, a série consegue a identificação do espectador – mesmo que esta nem sempre represente a realidade socioeconômica do público -, garantindo o envolvimento emocional da sua audiência.

Atrelado a abordagem, está ainda a estética: Euphoria cria um mundo de cores envolventes, usa e abusa do neom, e desenvolve uma atmosfera condizente com o retrato da vida daqueles jovens. A narrativa desenvolve-se de forma dinâmica, a série usa flashbacks, narrações e cenas ilustrativas – sejam elas lúdicas como também transmissões dos pensamentos dos personagens – para envolver mais o espectador.

Série Euphoria da HBO
Imagem: Reprodução/IMDb

Essas ideias e combinações cativam ainda mais o público, com tudo isso somado a personalidade de cada personagem a história se contrói fácil e acessível. Embora cheios de camadas, os personagens são, primeiramente, mundanos. Seus conflitos são o reflexo do mundo atual (depressão, sexualidade, fidelidade, amizade, relações, hereditariedade, liquidez).

O discurso de Euphoria é forte, realista e empoderador quando necessário. A série, entre isso, desenvolve arcos interessantes para cada um dos seus personagens. A surpresa está também no desenvolvimento destes arcos, afinal mesmo se tratando de um grupo de jovens, não necessariamente ou diretamente envolvidos, Euphoria abre espaço para os personagens que precisam disso naquele momento.

Ao longo da primeira temporada, cada um desses personagens vai se solidificando dentro da narrativa. Em alguns momentos há a afirmação daquilo que já é perceptível sobre eles, como também existe um desenvolvimento em prol da busca do autodescobrimento. Euphoria mescla organicamente essas unidades ao todo que está sendo construído, em uma configuração impecável.

Com esse conjunto, a obra se afirma episódio por episódio, suas engrenagens funcionam com naturalidade. Tudo que é posto em cena ajuda, do roteiro e seus diálogos sinceros e assertivos até as cenas mais graciosas de fotografia ímpar e trilha sonora envolvente. Euphoria é o grito de uma geração que busca pela felicidade sem saber onde encontrá-la.

Série Euphoria da HBO
Imagem: Reprodução/IMDb

Euphoria é o retrato mais verdadeiro e eficiente sobre esta geração em busca por liberdade, pela autossatisfação. É a afirmação da dependência e da falta da autossuficiência, é a mostra da limitação de até onde o “eu” é capaz de ir pelo outro – ou, simplesmente, a injustiça cometida em prol do que justo do si.

Com isso, Euphoria é a passagem de amadurecimento mais dura sobre a transição da adolescência para a vida adulta no século 21, é sobre, ainda, as pancadas que a vida dá sem que se tenha o discernimento sobre merecer ou não que aquilo aconteça. É também uma batida na porta daquilo chamado por muitos de carma, e por outros de destino. Mas é acima de tudo a vida como ela é em suas mais distintas medidas.

Euphoria consagra-se com toda essa carga emocional e dramática, com tudo que consegue entregar destes personagens (suas personalidades, seus conceitos, suas ideologias). Há espaço para mais, por isso uma nova temporada já está confirmada. Euphoria, então, deve, além de responder o que ficou em aberto, abrir ainda mais espaço para esses e outros personagens na próxima temporada.

Avaliação
Ótima
9.0
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Sou jornalista, fundador e editor da Matinê Cine&TV. Escrevo sobre cinema e séries desde 2014. No jornalismo tenho apreço pelo cultural e literário, além de estudar e trabalhar com podcasts. Além dos filmes e séries, também gosto de sociedade e direitos humanos.